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Jornalista envolvido e preocupado com questões sociais e políticas que afligem nossa sociedade, além de publicar matérias denunciando pessoas ou entidades que praticam atos contra o interesse público e agindo, sempre, em defesa da sociedade.

sexta-feira, 11 de julho de 2014



Artigo: O Papa, a tortura, e as legislações internacionais e nacionais  

Roberto Ramalho é advogado, jornalista, blogueiro e pesquisador

O papa Francisco condenou na festa de Corpus Christi (Corpo de Cristo), a tortura e instou os fiéis católicos de todo o mundo a trabalhar para abolir esta prática abominável, assim como para ajudar as vítimas dela e suas famílias.

Disse o pontífice perante milhares de pessoas que estavam na Praça São Pedro: "No próximo dia 26.06.14, terá lugar a Jornada Internacional das Nações Unidas para a apoiar as vítimas de tortura. Nesta circunstância, reitero a firme condenação de qualquer forma de tortura".

E foi o que aconteceu. O assunto foi debatido com exaustão.

O Papa Francisco também afirmou que a tortura é um grave pecado. Antes, o papa recordou a importância de praticar a caridade com o próximo, de "dar esperança aos que a perderam e de acolher os excluídos", em uma reflexão após a oração do Angelus (oração do Anjo, rezada ao meio-dia).

Francisco também se referiu ao dom que Jesus deu aos católicos, no dia em que se celebra a festa do corpo e sangue de Cristo. "Jesus não veio ao mundo para dar qualquer coisa, e sim para dar a sua própria vida como alimento aos que têm fé nele", disse o sumo pontífice.

As festividades em louvor de Corpus Christi foram instituídas pelo papa Urbano IV em 1264.

Em 1263, um sacerdote da Boêmia, Pedro de Praga, dirigia-se a Roma quando parou na cidade vizinha de Bolsena para celebrar missa. Na oportunidade o padre duvidou da presença real de Cristo na Eucaristia e pediu a Deus "um sinal". De acordo com a tradição católica, algumas gotas de sangue emanaram de forma imprevista da hóstia sagrada e caíram sobre o tecido que se estende no altar para por o pão e vinho sagrados, pano que está guardado na catedral de Orvieto, no centro de Itália.

O termo tortura provém do latim tortum, que quer dizer uma espécie de corda utilizada como instrumento de tortura.
Posteriormente, surgiu o tortur, que significa “o que submete à tortura” (FARIA: 1988, p. 551).

A tortura foi praticada durante séculos, principalmente sob o comando dos imperadores romanos, durante a idade média, sobretudo pela Igreja católica, ao perseguir filósofos e pensadores, considerando-os hereges, e as mulheres, que defendiam e lutavam por seus direitos e eram vistas como bruxas.

O Wikipedia define tortura comoa imposição de dor física ou psicológica por crueldade, intimidação, punição, para obtenção de uma confissão, informação ou simplesmente por prazer da pessoa que tortura”.

Também houve tortura quando das colonizações feitas pelos impérios britânico e por franceses, portugueses e espanhóis, bem como durante as 1ª e 2ª guerra mundiais, e, sobretudo, nas ditaduras militares da América Latina e também nas ditaduras europeias, e, ainda hoje, como forma de confissão de crimes.

Observe-se, contudo, que desde a promulgação da Constituição de 1988 a tortura passou a ser absolutamente proibida.

Porém, o legislador constitucional não definiu a sua prática. O artigo 5º, III, assegura que “ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante”. Nossa Carta Magna também prevê no seu artigo 5º, XLIX, que “é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”.

Também, ela dispõe, em seu artigo 5º, XLIII, que a tortura compõe o rol dos crimes mais graves no Brasil, sendo por isso inafiançável e insuscetível de graça ou anistia, por ele respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-lo, omitirem-se.

Em 15 de fevereiro de 1991 o Brasil aderiu à Convenção Contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes firmada pela ONU.

Nosso país também é signatário da Declaração Universal dos Direitos do Homem, do Pacto Internacional para a Defesa de Direitos Civis e Políticos, da Convenção Interamericana Para Prevenir e Punir a Tortura e da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), o que o torna apto internacionalmente a prevenir e punir a prática da tortura.

Entretanto, mesmo o Brasil sendo signatário dessas convenções, não havia a tipificação do crime de tortura em nosso ordenamento jurídico, pois apesar do Código Penal prever a tortura em seu artigo 61, III, “d”, essa era tida apenas como uma circunstância agravante.

Outro texto legal, O Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei nº 8.069/90, menciona, por sua vez, o crime de tortura apenas em face de crianças e adolescentes em seu artigo 233, não trazendo em seu bojo nenhuma definição sobre essa prática cruel.

Contudo, com o advento da Lei nº 8.072/90, o crime de tortura foi equiparado a crime hediondo em seu artigo 2º, dispondo que tanto os crimes hediondos, como a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo, são insuscetíveis de anistia, graça, indulto e fiança.

Sob forte influência de textos internacionais, como as convenções internacionais mencionadas e diante da gravidade do crime de tortura, em sete de abril de 1997 foi introduzido no Brasil uma lei específica sobre a matéria.

A Lei nº 9.455 trouxe em seu bojo algumas variações da tortura, considerando-a um crime comum praticado  por particular ou agente público, sendo que a este é aplicada pena mais gravosa, por ser ele um servidor público do Estado.

Essa Lei define o crime de tortura da seguinte forma:

Artigo 1º. Constitui crime de tortura:

I - constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico e mental:
a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa;

b) para provocar ação ou omissão de natureza criminosa;

c) em razão de discriminação racial ou religiosa;

II - submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo.

Pena - reclusão, de dois a oito anos.

Por atentar contra a liberdade e a dignidade do indivíduo, a tortura é um dos crimes mais repudiados pela sociedade em seu todo. Por essa razão, como bem afirma Franco (1997, p.61), “A tortura deve ser castigada em si mesma e por si mesma, em razão de seus detestáveis métodos e por seus fins contrários à liberdade e dignidade”.

É importante ressaltar e afirmar que a prática da tortura ainda está presente em nosso cotidiano, principalmente em relação às condutas de um determinado grupo de policiais civis e militares que se utilizam do cargo para constranger, com emprego de violência ou grave ameaça, os investigados e acusados de terem cometido algum delito, causando-lhes sofrimento físico ou mental.

De acordo com Madeira (2007, p. 209), “após 20 anos (hoje já são 26 anos) de redemocratização e égide de uma Constituição Cidadã, que preceitua a garantia de direitos fundamentais de toda espécie, deparamo-nos continuamente com violações de direitos humanos”.

Concluindo, o Brasil avançou muito em termos de legislação que pune a tortura, além de acatar legislações internacionais e aceita-las no âmbito da nossa estrutura jurídica em matéria de direito internacional.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em www.planalto.gov.br/Acesso em 22 de junho de 2014.

Lei nº 9.455, de 07 de abril de 1997. Define os crimes de tortura, e dá outras providências. Disponível em www.planalto.gov.br/Acesso em 22 de junho de 2014.

FARIA, Ernesto. Dicionário escolar latino português. 6ª ed. Rio de Janeiro: FAE, 1988.

FRANCO, Alberto Silva. Tortura, breves anotações sobre a Lei 9.455/97. In: Revista Brasileira de Ciências Criminais, n. 19, julho/setembro, 1997, p. 55-72.

MADEIRA, Lígia Mori. A tortura na história e a (ir)racionalidade do poder de punir. Panóptica, ano 1, nº 8, maio-junho, 2007.



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