Dia
mundial dos direitos humanos: nada a comemorar!
Roberto
Jorge Ramalho Cavalcanti, advogado
e jornalista. www.ditoconceito.blogspot.com.br
Este
artigo foi publicado originalmente em dezembro de 2020, na Revista
Jus
Navegandi.
Em
10 de dezembro de 1948, a Declaração Universal dos Direitos do
Homem, que enumera os direitos básicos e essenciais do ser humano,
nasceu. De lá até os dias de hoje, o que realmente mudou?
O
dia consagrado aos Direitos Humanos é comemorado todos os anos em 10
de dezembro.
A
data homenageia o empenho e a dedicação de todos os cidadãos
defensores dos direitos humanos que colaboram, incansáveis, na luta
para se por fim a todos os tipos de violações e discriminação,
promovendo a igualdade entre todos os cidadãos, raças, povos,
credos, religião, ideologia etc.
A
celebração da referida data foi escolhida para honrar o dia em que
a Assembleia
Geral das Nações Unidas proclamou, em 10 de dezembro de 1948, a
Declaração Universal dos Direitos do Homem,
que enumera os direitos humanos básicos e essenciais a que fazem jus
todos os cidadãos.
Esta
declaração foi assinada, inicialmente, por 58 Estados e teve como
objetivo promover a paz e a preservação da humanidade após os
conflitos da 2ª Guerra Mundial que vitimaram cerca de 70 milhões de
pessoas.
Este
dia é um dos pontos altos na agenda das Nações Unidas e se
desdobra em várias iniciativas a nível mundial, a fim de buscar a
promoção e a conscientização em prol da defesa dos direitos do
homem.
Em
síntese, Direitos Humanos são os direitos básicos de todos os
seres humanos, sem exceção. Havendo exceção, será ditadura,
arbítrio, tortura, desumanidade etc.
A
preferência por uma determinada designação varia no tempo e no
espaço. Originalmente, era disseminada a designação direitos
naturais, pois essa categoria de direitos era tida como universal e
imutável, decorrente da natureza humana, porquanto criada à imagem
e semelhança do criador (DEUS). Com a evolução histórica e a
positivação desses direitos (Positivismo),
passou-se a preferir, nos países anglo-saxões e latinos, a
expressão “direitos do homem”. Por ocasião da 2ª Guerra
Mundial e da fundação da Organização das Nações Unidas (ONU),
foi substituída por “direitos humanos”, na medida em que a
expressão anterior não necessariamente transmitia a ideia de que
contemplava também as mulheres (WESTON
Burns
H. Human Rights In: The New Encyclopaedia Britannica. 15 ed. Chicago,
1990. v. 20, p. 656).
Segundo
o jurista José Afonso da Silva, direitos individuais, direitos
subjetivos públicos, liberdades fundamentais e liberdades públicas
são designações modernas, mas que estão demasiado vinculadas a
uma concepção específica de Estado liberal. Pecam por uma
concepção individualista e anti-estatal dos direitos fundamentais,
incompatível com os mais recentes desenvolvimentos de direitos
sociais, coletivos e difusos, que dependem de prestações estatais
positivas (Silva, 1990: 180 e 181).
Assim
sendo, a melhor designação é aquela preferida pela tradição
germânica, qual seja, a de “direitos fundamentais da pessoa
humana”, ou, simplesmente, “direitos fundamentais”
(BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional 7 ed. São
Paulo: Malheiros, 1997. p. 514).
Mais
uma vez José Afonso da SILVA,
em sua obra (Curso
de Direito
Constitucional
Positivo,
15 ed. São Paulo: Malheiros, 1988, p. 182)
atribui a qualificação “fundamentais”
para
dar a entender que se trata de “situações
jurídicas sem as quais a pessoa humana não se realiza, não convive
e, às vezes, nem mesmo sobrevive”.
Já
o qualificativo “da
pessoa humana”,
por sua vez, implica que tais situações “a
todos, por igual, devem ser, não apenas formalmente reconhecidos,
mas concreta e materialmente efetivados”
(Idem: ibidem). Dessa forma, a referida designação faz referência,
também, à soberania popular como fonte de tais direitos, logo, à
sua largamente reconhecida historicidade.
A
Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão, votada pela
Assembléia Nacional Constituinte francesa, em 26 de agosto de 1789,
pretendia assinalar princípios que, inspirados no Iluminismo, iriam
fundar a nova Constituição
francesa. Interpretações marxistas dizem que esse propósito foi
defendido visando a assegurar, para a burguesia, no contexto de uma
sociedade de classes, o direito inalienável de propriedade,
com base no racionalismo e no liberalismo. O que realmente é uma
verdade inquestionável. Assim, vinculou-se a propriedade privada à
liberdade.
A
segunda geração de Direitos Humanos, de direitos econômicos,
sociais e culturais, foi reivindicada ao longo do século XIX, pelos
movimentos proletários socialistas. No entanto, tal idéia só foi
positivada, incorporada, no início do século XX, pelas
constituições revolucionárias mexicana e russa, bem como na da
República de Weimar.
A
partir da Europa, o sistema internacional vestfaliano foi se
consolidando, na medida em que se passou a identificar o Estado com a
Nação, dando ensejo à formação de Estados-nações. (Lafer,
Celso. A reconstrução dos direitos humanos - um diálogo com o
pensamento de Hannah Arendt, São Paulo: Companhia das Letras, 1988:
135).
Assim
sendo, observa-se que, por meio das expansões imperialistas,
generalizou-se o critério nacional, e o território e a população
do planeta acabaram divididos em Estados nacionais ou em impérios
coloniais centrados num Estado nacional. A concomitante expansão do
liberalismo fez com que boa parte dos novos Estados adotassem
constituições que reconheciam direitos fundamentais (Lafer,
1988: 137 e 138). Nesse sistema, a proteção internacional dos
Direitos Humanos se dava pelas vias diplomáticas, por meio das quais
cada Estado procurava zelar pelos direitos de seus cidadãos onde
quer que eles se encontrassem.
Em
suma podemos afirmar que Direitos Humanos são:
1).
Direitos
civis e políticos:
como, por exemplo, direitos à vida, liberdades de pensamento, de
expressão, de opinião, de crença, igualdade formal, ou seja, de
todos perante a lei, direitos à nacionalidade, de participar do
governo do seu Estado, podendo votar e ser votado, etc fundamentados
no valor liberdade;
(2).
Direitos econômicos, sociais e culturais:
como, por exemplo, direitos ao trabalho, à educação, à saúde, à
previdência social, à moradia, à distribuição de renda, entre
outros, fundamentados no valor igualdade de oportunidades;
3).
Direitos difusos e coletivos:
como, por exemplo, direito à paz, direito ao progresso,
autodeterminação dos povos, direito ambiental, direitos do
consumidor, inclusão digital, entre outros, fundamentados no valor
fraternidade.
O
mais interessante é que, justamente quando se comemora o “Dia
Mundial dos Direitos Humanos”, um presidente extremamente
conservador, desumano, responsável pela extinção do Ministério do
Trabalho, que não mais deverá fiscalizar os ambientes insalubres e
periculosos aos quais trabalhadores estão submetidos em seus
ambientes, além do trabalho escravo, rejeitou a realização
Conferência para o Meio Ambiente, que seria no Brasil em 2019.
Ele
impôs sua visão de mundo para os brasileiros. Em 2018, Bolsonaro
venceu a eleição com cerca de 55 milhões de votos, tendo o
adversário 47 milhões, sendo que os votos nulos e em branco
chegaram a 40 milhões, portanto, sem maioria.
Foi
diplomado nessa data comemorativa: 10 de dezembro, infelizmente, com
a total submissão da então presidente do TSE à época, e
presidente da entidade, Rosa Weber. Provavelmente o TSE sabia disso e
o fez para agradá-lo, numa total subserviência.
O
Poder Judiciário, hoje, praticamente não mais profere decisões
favoráveis ao trabalhador explorado e submetido a toda sorte de
humilhação por seus empregadores.
Embora
ainda existam os Tribunais Regionais do Trabalho, e o Tribunal
Superior do Trabalho, em geral as decisões são favoráveis aos
empresários e empregadores. Quando há condenação, os valores a
serem pagos a título indenizatório são simplesmente irrisórios.
Em
vários países do mundo a data realmente deverá ser comemorada. No
Brasil, não!
Assim
sendo, podemos afirmar, categoricamente, que muitos países, estejam
eles na Ásia, África, Europa, América Latina, possuem atualmente
governos autoritários, sejam eles populistas de esquerda (Venezuela,
Nicarágua, México, Etiopia, Moçambique e Angola), populistas de
direita (Belarus, Polônia, Hungria, Lituania, Estônia e Letônia),
e, sobretudo, na América do Sul, populista de extrema-direita
(Brasil), e totalitários (Coreia do Norte e China), não respeitam
os denominados “Direitos Humanos”, fazendo uso de diversos
instrumentos, sejam por meio de espionagem, escuta telefônica sem
autorização, perseguição político-ideológica, lesões
corporais, assassinatos etc.
O
Brasil é considerado pelas Nações Unidas um país que têm as
polícias mais violentas do mundo e são as polícias militares dos
Estados as que mais matam.
REFERÊNCIAS
1.
WESTON , Burns H. Human Rights In: The New Encyclopaedia
Britannica. 15 ed. Chicago, 1990. v. 20, p. 656.
2.
BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional 7 ed. São
Paulo: Malheiros, 1997.
3.
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo
15 ed. São Paulo: Malheiros, 1988.
4.
LAFER, Celso. A reconstrução dos direitos humanos - um
diálogo com o pensamento de Hannah Arendt, São Paulo: Companhia das
Letras, 1988.
Assuntos
relacionados:
- Direitos
humanos
Organizações
internacionais
ONU
- Organização das Nações Unidas
Filosofia
do Direito
Direito
Internacional Público
Autor
- Roberto
Jorge Ramalho Cavalcanti
Sou
advogado e exerço minha profissão há 36 anos. Elaboro peças nas
áreas do Direito Civil, do Consumidor, Trabalhista, Penal, presto
consultoria jurídica, elaboro pareceres e fui procurador do
Município de Maceió entre 2001 a 2002.
Informações
sobre o texto
Como
citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)
CAVALCANTI,
Roberto Jorge Ramalho. Dia
mundial dos direitos humanos: nada a comemorar!. Revista
Jus Navigandi,
ISSN 1518-4862, Teresina, ano
25,n.
6376, 15
dez. 2020.
Disponível em: https://jus.com.br/artigos/87376. Acesso em: 10 dez.
2021.